Nasci pra ser vilã. Me sinto um pouco desprezível, nem pelos atos em si, mas pelo fato de que não consigo me desvencilhar desse peso que me puxa sempre pra baixo, pra inércia e apatia. Eu sempre estou a poucos passos de um grande abismo, e tento me esquecer do desespero da minha vida. O desespero é sempre uma constante.
Sinto-me chata, esquisita, sempre a esquisita e mal amada, que não se faz compreensível. Cansada de tudo isso, mas ao mesmo tempo incapaz de fazer as coisas diferentes. Essa família me desespera e o desespero não me deixa viver mais que o necessário. E assim eu sempre choro e respiro porque viver é minha obrigação. E tudo é esquisito e pesado. O ar é como se fosse lama, e essa lama pesa sobre mim e não me permite movimentos bruscos. Eu quero sair dessa lama, que me oprime e me protege. Fora daqui me sinto feliz, mas no meu cérebro reluzem fragmentos do medo, que me conduz de volta à lama da opressão e do conforto das paredes. E viver torna-se cada vez mais difícil dessa forma, nessa espessura rude de realidade, intransigente, indesejável.
Por que não consigo me sentir mais feliz? Se é que um dia fui, porque tudo agora me parece ter sido ilusão, um modo paliativo de prosseguir, quando você permanece imune a essa bruma quente de tristeza do mundo. Difícil de respirar. Como a morte. Ela parece se atrasar, rir de mim espreitando-me do armário. Ri de mim. E eu sinto isso, e choro. Sei que ela não me assusta apesar disso. É fresca, uma esperança enfim. Um pontapé de renovação. A vida se diverte às minhas custas. Me entupo de antidepressivos pra conseguir viver sem tomar conhecimento das coisas. E já me sinto meio morta, vivendo dessa forma cretina e violenta. Passageira clandestina de um trem fantasmagórico, cheio de pessoas ricas, sorrindo com seus dentes amarelos e seus casacos elegantes de pele de bicho decadentes. Elas sorriem e me intimidam com suas porcarias reluzentes, suas vidas falsas e cheias de caprichos superficiais. Sinto pena e sinto angústia diante de tudo isso. Deslocada. Sempre.
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