domingo, dezembro 26, 2004

Vazio natalino.

Eu ainda não consigo acreditar em Natal. Talvez porque eu nunca tivesse uma família de verdade a ponto de merecer uma confraternização como fazem todas as outras. E comemorar com a família dos outros sempre foi pra mim como viver da caridade e os restos, as migalhas dos demais. Sempre me entristeço com essa sensação que nunca me escapa no final de dezembro. Meus pais sempre foram a ausência presente. Nem sei se posso considerá-los realmente minha família. Não tenho sequer a amizade deles, a sintonia que têm todos os filhos com seus pais. Pra mim isso não existe, e o Natal é apenas a data pra rememorar este vazio intenso.

Meus amigos acabam sendo a minha escolha, o alvo do amor que não tive a quem dar pela família inexistente. Pareço até personagem Disney, sempre órfão ou vivendo entre madastras cruéis ou familiares merecedores de castigos sem limites, mesmo sendo tudo isso um exagero às minhas atuais circunstâncias. De certo modo, minha ausência do mundo e essa vontade de se fazer invisível até que se acabem todas essas comemorações que não me cabem é fruto desse sentimento, dessa sensação de abandono e invisibilidade eterna. Não estou acostumada ao calor humano e tudo isso me é novo e me assusta. E é por isso que eu fujo. Sempre fujo, tentando esquecer que existo, que alguém ainda assim me deseja por perto e eu não quero ter que me abrir e sentir o calor que até então era me privado pela ausência dos que deveriam ser presentes sempre em minha vida, mas que nunca estiveram por perto com braços abertos para o amor e para o natal. Agora não me interessa mais tudo isso e eu continuo a fujir, a escapar entre os dedos dos que mesmo assim me querem presente.

Mesmo aos meus amigos é de certa forma um pouco doloroso desejar feliz natal, sabendo que no fundo, mesmo com eles perto e todos seus desejos sinceros de que eu tenha também um dia feliz e cheio de amor e amizade, não consigo deixar de me questionar sobre tudo aquilo que a data simbolizava pra mim, que era distante de tudo aquilo que deveria ser. Uma ausência minha, e somente minha, que se tornou parte de mim e de minha história, aparentemente perpétua, irremediável. Até quando não sei dizer.

Por isso espero passar esse final de ano e as datas terríveis, as datas do vazio e da vontade de permanecer isolada em reflexão (des)necessária para voltar ao convívio pleno aos que me são queridos, aos meus amigos, aqueles que tudo significam de humano para mim. Enquanto isso, volto à minha rotina de fugas bestas e covardes, de raiva, lágrimas, alegrias também, e uma solidão benéfica, que me faz mais forte, embora azeda certas vezes. Pois saibam que, embora pareça insensível e cretina, amo todos vocês, e isso ninguém me tira, nem mesmo minhas confusões emocionais bizarras que surgem das trevas do meu coração. Volto logo e, enquanto isso, espero que divirtam-se e aproveitem suas famílias presentes, os amigos e os presentes de grego, os bebuns e todas as alegrias que puderem ser sentidas.

Beijo nas crianças.

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